quinta-feira, 25 de agosto de 2011

o dia de amanhá

ignacio martínez de pisón: el día de mañana. seix barral. barcelona 2011.

duas recomendaçons, mas as duas tam entusiastas que acabei por encarregá-lo, mercá-lo e lê-lo. aos poucos, dosificando. levou-me três dias porque me neguei rotundamente a devorá-lo numha tarde.

e comparto.

penso que é um livro boíssimo. onde nom sobram palavras. onde nom sintes a falta de nengumha. onde cada intervençom tem sentido: ajuda a ver a imagem do puzzle e faltando ficaria um oco descuberto na mesa.

gostei da singeleza do estilo, da combinaçom de vozes (homens, mulheres, vítimas, cúmplices, ricos, pobres, burgueses, currantes...) e a ausência, total, da voz do protagonista. porque é um livro com um claro protagonista, justo, ao que nunca, nunca, podemos escuitar directamente. 

essa é, para mim, a fortaleza do romance. o fácil seria colocar ao mau dando o discurso explicativo-justificativo, tipo eu nom sou mau, o que passa é..., ou bem hahahahahaha, olha que mau que fum!. martínez de pisón nom faz nem umha cousa nem outra. coloca um prota que nunca se defende nem se justifica nem se explica nem pressume nem objecta. nada. e faz-no de umha maneira magistral.

todas as testemunhas que falam de justo tenhem ademais a sua própria história. e este é outro dos acertos da obra, claramente estrutrada: cada testemunha introduze a sua vida antes de explicar a sua relaçom com justo, e essas introduçons som novas tesselas que ajudam a construir o mosaico da vida na barcelona franquista dos anos 60 e 70.
enfim, leitura mui mui recomendável.




segunda-feira, 22 de agosto de 2011

ares bem difíceis

almudena grandes: los aires difíciles. tusquets. barcelona 2002.

para mim resultou, sobretodo, um livro tristíssimo sobre pessoas tristíssimas. e nom um triste livro, que é diferente. 
dúas pessoas decidem refazer as suas respectivas vidas mudando-se a umha nova urbanizaçom a pé das praias gaditanas. ela, sara, foge sozinha, ele, juan, fai-no acompanhado da súa sobrinha orfã e do seu irmão retrassado. a mulher que faz a limpeza em ambas as casas exerce de canle comunicante entre elas. 
e vamos lendo e descobrindo que todas as pessoas que habitam os dous chalés resultam seres solitários e abandonados na vida. seres que escondem segredos, medos e angústias que cada amanhá tencionam simular sob a máscara da normalidade. 

a base da narraçom está nas analepses que rebordam cada capítulo. em cada um deles assume a perspectiva da narraçom umha das personagens que vai trazendo ao presente memórias dos momentos que marcárom a sua vida e forçárom a sua chegada a esse recanto do sul. 
e seguimos lendo e seguimos conhecendo os interiores desolados dumhas pessoas para as que, o difícil, nom é resistir a lestada ou o vento de poente, mas a dor de respirar o ar cada três segundos. 

duas únicas pexas: ao começo faziam-se-me pesadas e repetitivas as contínuas metáforas e comparaçons com que a narradora acompanhava os comentários sobre a situaçom anímica das personagens. com o avanço da leitura afigem-me, e até me parecérom necessárias.
e o final, para mim contraditório com a imagem que se constrói previamente de sara, a protagonista. a sara que imos conhecendo, ou que eu creio conhecer após a leitura, nom deixaria entrar ao polícia tam alegremente na sua casa, e menos o deixaria só com afonso conscientemente. deveria ter acontecido doutra maneira. 

em todo o caso, penso que esta mulher é umha grande, nunca melhor dito, escritora.

o jardim esquecido

kate morton: el jardín olvidado. suma de letras. madrid 2010.

nom sabia que era um best-seller. soube-no depois de lido. é bom deconhecer estas cousas, porque eu sou umha leitora fundamente prejuiçosa.  

do livro gostei. a trama engancha. há três épocas, três protagonistas mulheres, e um conflito comum. a mais nova de todas elas, a da época actual, busca dar soluçom a um segredo familiar, que nós imos conhecendo da mão das suas pesquisas e das outras narraçons cruzadas com a principal. 

o livro está bem construído. dá as suficientes falsas pistas para manter a atençom do leitor, mantém a intriga, e penso que as contextualizaçons ambientais (essas ribeiras londrinas, que recordam as crianças de dickens, as mansions vitorianas da austen) estám bem logradas. bebe de múltiplas fontes, surpreedentemente pouco australianas, para dar com um cóctel que seduze e atrapa. 

sobrar sobrárom-me os contos de fadas: demasiado artificiosos.

também é certo que nom lhe pedim mais...



sexta-feira, 12 de agosto de 2011

leituras demoradas: de cóleras e chocolates

gabriel garcía márquez: el amor en los tiempos del cólera. mondadori. barcelona 1999.
laura esquivel: como agua para chocolate. debolsillo. barcelona 2003.

o tempo nom deixou de passar por estas duas obras. forom escolhidas para ler no clube de leitura de papás e mamás do licéu. já tinha lido as duas há umha cheia de anos. a de garcía márquez guardava na memória o primeiro posto em preferências (descontado os cem anos, que som antológicos). da de esquivel guardava mais memória das imagens do filme, visionado no cinema yago de compostela que da narrativa, mas a memória era positiva e carinhosa. 
porém o tempo passou, a vida por mim e polos dous livros e a leitura já nom foi a mesma. odeio florentino ariza. nom sei como puidem gostar de semelhante machistada senimental. essa ideia de que podes ter um amor eterno, a um tempo folhar com quanta mulher se ponha diante, e ter a desfachatez de afirmar que te mantés virgem para a amada porque as outras nom tenhem valor. o que mais raiva me dá é pensar que na primeira leitura nom prestei atençom a isto, mas todo o contrário, ficou em mim a ideia de que o amor era isto que reflectia o romance. a posiçom do narrador tem a suficiente ambiguidade como para que a discusom no clube fosse se essa era a educaçom sentimental que defendia garcía márquez ou realmente ele quis denunciar esse concepto do amor e das relaçons entre homens e mulheres. como admiro garcía márquez, opto por defender o segundo.

o mesmo me aconteceu com o livro da esquivel. se isso é o amor, mamaínha!
e outra cousa encontrei em comum entre as duas obras: demasiados adjectivos. descubrim que agora mesmo prefiro os estilos menos barroquizantes. a singeleza narrativa é mais do meu gosto. e em ambas a obras tivem a sensaçom de adentrar-me numha selva rebordante de cheiros, aromas, cores e tactos, para mim de mais. vam-me mais os prados e as veigas. sem excessiva vegetaçom.

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

náufrago do paraíso

marcos calveiro: lois pereiro.náufrago do paraíso. xerais. vigo 2011.

dentro da vorágine de livros adicados ao autor das letrasgalegas de cada ano, caeu-me este nas mãos em forma de presente. é um desses livros de encarga, suponho, pois está editado na colecçom fóra de xogo, dirigida a público juvenil. é dizer, um livro feito para licéus de secundária, basicamente.
entrei na leitura sem muitas expectativas, sem aguardar nada, mais bem com o morbo de ver como defrontava o autor dumha maneira politicamente correcta, a tam pouco politicamente correcta mocidade, luita e morte de lois pereiro. 
e chegou a surpresa. o primeiro lance deixou-me k.o. umha conversa entre duas velhas num cemitério.  impressons ante o epitáfio de lois. essa frasse nom era para pór aqui... boíssimo!
com muito acerto, penso, o autor coloca-nos ante umha biografia dramatizada (apresentam-na na contra-capa, como guiom cinematográfico, mas em realidade cumpre com todas as normas do teatro). pequenas cenas que recolhem momentos concretos, anedotas ao longo da vida de lois pereiro que conseguem, penso, que quem lê se faga umha imagem poliédrica do poeta. para mim, o único que fica curto é precisamente, a antologia poética.

umha encarga bem cumprida, sim senhor.

leituras demoradas: ayes deste meu país

j.l. do pico orjais e isabel rei sanmartim: ayes de mi país. o cancioneiro de marcial valladares. dos acordes. baiona 2010.

nom sei música. nada de nada. nem sei solfejar e seique nem tenho ouvido (diz meu pai), ainda que me esforce em aprender toques e cantos de pandeireta. e por que merquei este livro (e lim, claro), se é de música? umha, porque umha das autoras é isabel, amigha guitarrista que apreço muito; duas, porque o outro autor nom o conheço persoalmente, porém sigo atentamente as suas andanças através da internete. e três, porque estudam parte da obra de um senhor (reitegrata fundacional) que também admiro, o valladares. triplo compromiso, portanto.

ayes de mi país consiste numha ediçom fac-simile do cancioneiro popular que marcial valladares tinha recompilado meado o século xix. o interesse deste cancioneiro está no feito de conservar letras e partituras musicais. para mim, como já digem, ignorante na arte de solfejar e diferenciar graves e agudos, fusas e semi-fusas, podia ter o interesse das coplas e letras recolhidas. era-me avundo.

mas entrei na introduçom. os autores tencionam explicar-nos o contexto social e cultural em que este cancioneiro tem nascido. tencionam e conseguem, porque a sua achega resulta do mais interessante. 
na zona da estrada sempre houvo umha funda tradiçom musical popular, som várias (e fôrom mais) as bandas de música e muitos mais os grupos de música tradicional, os coros e ruadas, etc. e saber que numha casa labrega rica, como a de marcial valladares, havia tanta variedade de instrumentos, tanto gosto pola música, ajuda a comprender essa tradiçom. 
as cousas cobram o seu sentido quanto mais conheces. e é muito importante focar a atençom nesses trabalhos aparentemente marginais (centrados como estamos muitas vezes no labor literário ou historiográfico de certas figuras) para ter umha visom mais completa do que foi a posta em valor da cultura galega no xix. 

enfim, que eu saquei proveito do livro sem saber de música. imaginai aquelas que tenhades mais cultura musical ca mim... 

leituras demoradas: as terras imaginadas

guillaume duprat: el libro de las tierras imaginadas. oniro. barcelona 2009.

se alguém pensa que os medievais andavam loucos por pensar que a terra era plana ou colombo algho chaveta por defender que tinha forma de péra, que leia este livro. 

o livro das terras imaginadas é um delicioso passeio, para quem goste de mitologias e geografias, por distintas imagens da terra para múltiplas culturas do planeta: terras suportadas por dragons, serpes, elefantes, peixes, tartarugas, árvores, terras que flutuam no ar, num mar eterno, numha pota de sopa, terras acovilhadas em baús, terras em terra...

o autor divide o livro em capítulos, agrupando as terras geometricamente: poligonais, circulares, esferoidais... cada descripçom vai acompanhada dumha cuidadíssimas ilustraçons e um monte de lapelas a esconder segredos e surpresas.

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

um mundo de mamás

marta gómez e carla nazareth: un mundo de mamás. comanegra. barcelona 2009.

merquei-no para regalar a umha mamá, mas antes lim-no. 

e foi umha pequena decepçom. porque aguardava algo estilo princesas esquecidas.
e assim como das ilustrações gostei muito, os textos nom acabárom de convencer-me. parecérom-me bastante repetitivos (mesmas cores, mesmos adjectivos, mesmas referências sensoriais) e, em geral, e acabando pronto, um algo melindrosos. 

leituras demoradas: maus tempos

carlos giménez: todo 36-39. malos tiempos. debolsillo, random-house mondadori. madrid 2010.

pensava que a capacidade de debulhar o horror da ditadura franquista estava totalmente desenvolvida no paracuellos que este homem guionizou e desenhou. pode ser. 
mas também hei de aceitar que nom tinha falado do horror da guerra. e esse está aqui, nesta compilaçom de todos os cadernos adicados a contar-nos como vivêrom a guerra en madrid, nesse madrid bloqueado e sitiado polo fascismo e que acabou por render-se à evidência de que o mal, quase sempre, trunfa.
as histórias de malos tiempos tenhem como protagonista umha família normal dum bairro normal de madrid. pai, nai e quatro crianças. pai operário numha fábrica de roupa, nai cuidadora da casa. pai afiliado ao partido socialista. simplesmente. 


através deles, sobre todo das crianças, sabemos dos bombardeios, da fame, das luitas no frente tam afastado que está só a um par de ruas, das mudanças obrigadas polos destroços das bombas e a necessidade de anonimato, da fame, da escaseza e as enfermidades, da irrupçom da tuberculose, do fanatismo, da fame.
e da tenrura e o humor e o amor e a solidariedade. da dignidade das vítimas que renúnciam ao pam do inimigo.
e um epílogo magistral do autor no que se reivindica como historiador objectivo mas nom por isso neutral. 

terça-feira, 2 de agosto de 2011

leituras demoradas: o sha

ryszard kapuscinski: el sha o la desmesura del poder. anagrama. barcelona 2007.

tanto me tem se era exagero ou nom, se era mentira ou se as fontes era descuidadas e manavam tóxicos. tanto me tem que kapuscinski seja apontado polo dedo de alguns assegurando que nom dizia a verdade. porque é possível que nom conte toda a Verdade (por umha vez usarei maiúsculas), mas certo é também que diz grandes verdades e mui bem ditas.
de pérsia pouco sei: lembro a presença habitual nas revistas do coraçom, para mim impactante, de soraya, a princesa dos olhos tristes. pouco mais. muito tempo depois chegou a leitura de persépolis e todo aquilo de marjane satrapi que me caisse nas maos.
botei-lhe o dente a este livro sobre o sha quadrando com as mobilizaçons no magreb e as do quinze-eme. e nom puidem evitar a sensaçom de que aquilo que lia nos jornais tinha muito que ver com o que lia em kapuscinski.  

quando se fala da queda da ditadura (e o regime do sha tinha sido umha ditadura particularmente brutal e pérfida) nom pode ter-se a ilusom de que com ela acabe todo o sistema, desaparecendo como um mal sonho. em realidade só acaba a sua existência física. porém, os seus efectos físicos e sociais permanecem, vivem e durante anos fam-se lembrar, e incluso podem ficar em formas de comportamentos cultivados no subconsciente. a ditadura, ao destruir a inteligência e a cultura, deixa detrás de si um campo baldeiro e morto no que a árvore do pensamento tardará muito tempo em florescer. a este campo ermo saem dos seus esconderijos, dos recantos e das fendas nom sempre os melhores mas, amiúde, aqueles que resultárom ser mais fortes; nom sempre aqueles que traerám e criarám novos valores senom aqueles aos que a sua dura pele e resistência interior permitiram sobreviver. nestes casos a história começa a virar num trágico círculo vicioso e ás vezes é preciso um século inteiro para que poida sair dele.  
referia-se ao irám, mas eu pensava que falava do franquismo e do que nos veu em cima (está vindo) depois.

roubavam todos os que ostentavam algum poder. se alguém que, ocupando um cargo importante, nom roubava, criava-se em torno dele um baldeiro: despertava suspeitas. todos diziam dele: "seguro que é um espia que nos foi enviado para denunciar quem rouba e quanto, porque estas informaçons som necessárias para os nossos inimigos". em quanto podiam, desfaziam-se do homem que lhes atrapalhava o jogo. deste modo chegou-se à inversom de todos os valores. quem tratava de ser honrado era acusado de ser confidente a soldo. se alguém tinha as mãos limpas, devia agachá-las o mais profundamente possível. o limpo levava consigo algo de vergonhento, de ambíguo.
referia-se aos negócios do sha e os seus amighos, mas eu pensava que se referia corrupçom que (camp)a na galiza e nas espanhas.

a experiência tinha-lhes aprendido que deviam evitar pronunciar em voz alta palavras como agóbio, escuridade, peso, abismo, trapa, lamaçal, descomposiçom, gaiola, relhas, cadeia, mordaça, moca, bota, mentira, parafuso, peto, pata, loucura, e também verbos como tombar, assustar-se, plantar-se, perder (a cabeça), desfalecer, debilitar-se, ficar cego, xordo, afundir, e incluso expressons (que começassem com o pronome algo) como algo nom quadra, algo nom encaixa, algo vai mal, algo rachará, porque todos estes substantivos, adjectivos, verbos e pronomes podiam constituir umha alusom ao regimem do sha, portanto eram um campo semântico minado que avondava calcar para choutar polos ares. 
falava do medo à savak, a polícia política do sha, mas eu pensava que se referia à pressom que ainda hoje há para nom dizer em voz alta certas palavras (como independência, laicidade, feminismo, ditadura franquista, tortura...)

umha leitura muito recomendável.

leituras demoradas: conquistadores do horizonte

felipe fernández-armesto: los conquistadores del horizonte. una historia mundial de la exploración. destino. barcelona 2006.

levou muito tempo esta leitura. um senhor livro de mais de quinhentas páginas, que fum debulhando pouco a pouco desde o verám passado. trata-se dumha obra divulgativa, um recorrido por todo o planeta através de todas as explorações havidas e por haver. 

a mim resultárom-me do mais interessantes as páginas adicadas ás primeiras explorações, aquelas que estendérom a espécie humana pola terra, e aquelas adicadas a explorações nom-ocidentais: as chinesas (interessantíssimas), as arábigas, as da oceania, etc.

andava eu felicíssima de ter dado com um livro des-eurocentralizado, que dava atençom a outros pólos culturais e valorizava as suas descobertas e achados, ainda que esta posta em valor implicasse romper com tópicos sobre a superioridade do européu ou o ocidental. nessas andava, sim.

e depois de tantas páginas lidas, de tanto aprendido em cada capítulo sobre ventos e correntes e arte de navegar, o triste é que só me quede com o poder que o patriarcado (por nom dizer o sexismo puro e duro) exerce sobre as pessoas. incluso sobre aquelas que parecem presentar umha grande apertura intelectual. 

vejamos. o autor pom em valor o labor de guias indígenas para explicar o conhecimento e o acesso ao território americano por parte dos européus: Un indio llamado Nigual trazó para Francisco Valverde de Mercado, en 1602, un mapa esquemático de Nueva España que se ha conservado hasta nuestros días. Los iroqueses usaron... que bem!, penso eu, alguém que tem em conta aos índios! mas chegamos a este fragmento: Cortés ha sido sobrevalorado como conquistador. Fue una coalición de pueblos indígenas la que derrocó a los aztecas (ó, nom é chovinista!, estupendo!). Parece que esa alianza fue tramada no tanto por Cortés como por su amante indigena, que era también su intérprete y la única persona que podía comprender lo que ocurría en el terreno diplomático. e chega, primeiro o baixom, e depois, ou com ele, a indignaçom. 

duas machistadas comete o autor numha frasse: negar o nome a umha pessoa e antepór a sua (suposta) relaçom sentimental com um homem à sua relaçom social/profissional. já que o tratamento dado a outras pessoas indígenas que aparecem na obra é do mais respectuoso, temos que entender que esta inferiorizaçom da malitzim e por ser ela mulher, nom por ser mexica.
como um homem que demostra estar mui documentado (o livro acompanha-se de vinte páginas de notas bibliográficas) pode nom saber o nome de malinalli tenepatl? malitzin, malinche ou dona marina som outros dos nomes da intérprete de hernão cortés. se era a sua amante ou nom nom é assunto de um tratado sobre explorações marítimas e terrestres, igual que nom nos importa se o nigual da anterior citaçom era homosexual, por exemplo.

O sonho da Malinche, de António Ruíz, 1939

com esta machistada conseguiu que eu pugesse em questom toda a sua obra. eu pilhei-no num renúncio em um tema que conheço mais ou menos bem, por tê-lo estudado pormenorizadamente (a conquista de méxico por hernão cortés). que mulheres nom terá ignorado noutras partes? a quantas nom terá dessabido?

depois da meianoite

salma: despois da medianoite. xerais. vigo 2011.

a leitura da estranheza. umha estranheza consciente. porque podia recorrer ao glossário final que maría preparou para nós, leitoras de cultura alheia. porque tenho contacto com pessoas de támil nadu que poderiam resolver-me dúvidas culturais. porque eu mesma visitei támil nadu e soubem da situaçom de tantas mulheres como rábia ou wahida. mas optei por fazer umha leitura desde a estranheza porque isso quer este livro e isso quigérom a autora e a tradutora.
estranheza polo léxico, por essa abafante presença do támil in-traduzido, pola minuciosa descriçom de costumes que nos som alheios, cultural e religiosamente, pola sobreabundância de nomes de mulheres e tias e filhas e nais e vizinhas que fam que perdas o fio e nom o deas encontrado até bem avançada a leitura, pola enormidade da narrativa, 640 páginas que se dizem bastante mais rápido do que se lêm. enfim, umha leitura estranha e difícil.

e resulta que nom. que o romance envolve, a história atrapa, passeninho, porque nom semelham passar grandes cousas. a fim de contas estamos a falar da vida pobre dumhas mulheres num recanto do mundo, com um quotidiano limitado a cozinhar, parir e cuidar da honra familiar.  

e desde o começo percebes como depois da meia-noite, nas sombras, acovilhadas entre a rotina dos dias, vam discorrendo vidas autênticas con conflitos iguais, semelhantes ou paralelos aos deste outro recanto do mundo que nom nos é estranho nem no léxico nem nos costumes religiosos e culturais nem nos nomes de mulheres e tias e filhas e nais e vizinhas. 

porque se algo sacas da leitura é que as inquedanças que abafam e animam ás mulheres pobres e musulmás de támil nadu nada tenhem de exóticas e em pouco se diferenciam das inquedanças que abafam e animam á mulheres ricas, ocidentais e católicas de qualquer aldeia do rural galego.

bençom, salma.

a evoluçom de calpúrnia

jacqueline kelly: la evolución de calpurnia tate. roca editorial. barcelona 2010.

o outro dia merquei uns choquinhos para o jantar. mentres os limpava deu-me por observá-los atentamente. queria saber em que se diferenciavam de luras e jíbias e potas e demais especimes que geram tantos debates arredor da mesa sobre o seu nome e formas verdadeiras. botei uns minutos paponeando para os bechinhos.

por culpa da calpúrnia. dias antes acabara a leitura da evoluçom de calpúrnia tate, um romance que conta a história da relaçom da menina que dá título á obra com o seu avó. com ele aprende a interessar-se polo mundo que a envolta e aprende a arte da observaçom e da curiosidade. só que calpúrnia vive dacavalo entre os séculos xix e o xx e isso de ter curiosidade e interesse na ciência nom é cousa de meninas casadeiras de boa família. 

os intuitos observadores da protagonista nom param nos insectos, roedores, plantas ou flores que encontra ao seu passo, nos passeios que dá com o avó dumha mao e darwin da outra. o interessante da narraçom é que a sua capacidade observadora leva-a a questionar a sua situaçom na família e na sociedade, a ver as evidentes desigualdades entre ela e seus irmãos, na educaçom recebida, nas expectativas de futuro, etc. e arreponher-se a essa situaçom.

ao livro chegamos através do clube de leitura, pois se complementava mui bem com a emília das últimas sessons deste curso: a da expediçom ao pacífico de marilar aleixandre. que conste que me encheu mais esta calpúrnia.

segunda-feira, 25 de julho de 2011

leituras demoradas: demasiado silêncio

manuel rivas. todo é silencio. xerais. vigo 2010.

lim-no bem. há obras (narrativas) do rivas que nom dei acabado. assim que esse lim-no bem tem umha conotaçom muito positiva. sim, lê-se bem. mas...
o malo maloso de todo é silencio é un narco galego. nas suas atitudes, na maneira em que constrói a sua personagem (ele na sociedade, nom o autor na obra) é umha mistura perfecta de duas pessoas reais que eu conheço: um narco já falecido e um empresário de pro, os dous do meu concelho (para quem conheçades coma mim, mistura de t******* e s***). juro que o que nom tem de um tem-no do outro, sejam acenos, estilos ou anedotas que, certas ou nom, sim som tomadas como tais pola vizinhança. em troca, o malo maloso do romance nom acabo de crer-mo. semelha demasiado caricaturesco. porque a verossimilitude narrativa nada tem que ver com a realidade. e é como se o rivas porvezes o esquecera.
ademais disso, penso que é um romance incompleto. nom sei se tinha medo doutro oslivrosardemmal (e nom devera) volumoso e enorme. mas a sensaçom que me quedou quando acabei a leitura foi um já?.

leituras demoradas: leite derramado.

chico buarque. leite derramado. dom quixote. lisboa 2009.

quando gostas muito de um artista nom aguardas muito dele noutra faceta. a mim acontece-me isso com aqueles que sendo destacados noutra cousa, se metem a escritores. e claro, eu sempre gostei muito muitíssimo do chico buarque sambista. e nunca me deu por ler-lhe livros, porque teve ademais a ousadia de nom pretender-se poeta (casa bem com o papel de letrista cantor) mas narrador. e eu dizia-me, cai-me demasiado bem para arriscar umha decepçom. 
e cheguei a leite derramado. tem razom o crítico da ligaçom anterior em que tem um argumento conhecido, e recorre a umhas técnicas pouco originais e nada inovadoras. e que? eu descobrim um bom, muito bom, escritor. fiquei des-decepcionada e só por isso recomendo a todo o mundo esta novelinha.
fum quem de acreditar na verdade tropical do protagonista, aceitando que seja caricaturesco ou típico. e fum quem de seguir a leitura com vontade de saber em que acabava e sem sabê-lo afinal muito bem. 

sábado, 23 de julho de 2011

emaús

alessandro baricco: emaús. anagrama. barcelona 2011.

foi um presente de aniversário bem jeitoso. o senhor baricco luze-se neste romance. 
nele situa-se nos anos 60-70, numha cidade italiana que eu associei ao norte, e conta as aventuras de um grupo de quatro adolescentes. católicos. muito católicos. obsessionados com a culpa, o pecado, o sexo e as mulheres, como nom podia ser menos.
um desses quatro adolescentes exerce de narrador e penso que é aí onde acerta o autor, na forma que dá a essa voz ainda crente meio descrida ciente dos feitos negadora dos mesmos. utiliza em muitas ocasiões um nós intolerante que ao tempo que apavora faz ver, meridianamente, a força que a educaçom católico-capadora exerce sobre os protagonistas. 
os moços estám, cada um na sua medida, obnubilados com a figura dumha rapariga, de costumes totalmente diferentes aos próprios, umha madalena que uns querem namorar e outros (os mesmos?) reconduzir ao bom caminho. porque eles som católicos e pensam assim.
penso que neste caso os feitos som o de menos. o interesse está nas reflexons de narrador e personagens, no bem que reflictem como nascem, crescem, se reproduzem e ocultam as suas dúvidas religiosas e como aceitam sem duvidar moralmente a hipocrisia da sociedade na que vivem.
romance muito bom. 

noite de alacráns

alfredo gómez-cerdá: noche de alacranes.ediciones sm. madrid 2005.

outro romance sobre a guerra civil!! e outro mais do que gostei! se me pilha um destes anti-história... neste caso a protagonista é umha velha que é convidada por un profe de instituto para dar umha palestra ao seu alunado. pede-lhe que dê conta das suas experiências como guerrilheira fugida aos montes durante a guerra civil. a noite anterior á cita no centro de ensino, a velha, insone, faz repasso da sua vida. 
para mim o melhor do romance está na protagonista e na sua história: temos ante nós umha velha crível, que semelha nom mentir contando a sua experiência. e semelha nom mentir porque nom narra feitos heroicos, nom. tal como conta a sua adolescência percebemos melhor o sem-sentido da guerra: pois muitas das suas vítimas o som polas circustâncias que vivem, nom porque esteam ideologicamente marcadas. temos ante nós umha rapariga de 15 anos que se vê assediada polos fascistas sem saber por que, que desconhece em que anda a sua família, que namora do inimigo, sem saber que o é (é-o?) e que acaba na guerrilha clandestina por amor a esse inimigo, nom por solidariedade com a causa. mas é precisamente esta vitimizaçom injusta a que acaba por espertar-lhe a consciência ideologica...
e tudo isto mui bem contado...

idades, cidades e divindades

mia couto: idades cidades divindades. caminho editora. lisboa 2007

mia couto é conheido pola sua narrativa, sendo sempre destacado como contador de histórias. mas eu fiquei atrapada com este livro de poemas.
masculino de noiva é navio
só por este verso vale a pena. destila toda a arte de mia couto: brincar com as palavras quotidianas da língua até transformá-las e outorgar-lhe nom novos significados, mas significados míticos que tinhamos esquecido. adorei. gostaria de fazer algum dia algo semelhante com este meu português chamado galego. 
os poemas bebem da tradiçom oral, popular; muitos deles buscam dar estilo ás vozes populares moçambicanas e misturam isto com a reflexom vital que roça a filosofia, se é possível desligar umha cousa da outra:

O outro idioma 
Inquirido
sobre a sua fluência
em português, respondeu:

- Tenho duas línguas:
uma para mentir,

outra para ser enganado.
A professora
ainda perguntou:
- E qual delas é o português?

- Já não me lembro, respondeu.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

leituras demoradas: sostém pereira

antonio tabucchi: sostiene pereira. anagrama: barcelona 1994.

em que mundo vives, pereira?

já lera este romance de tabucchi. é umha leitura antiga, tanto que nem a lembrava. lim-na ao voltar de lisboa, onde vivim uns messes, e sei que fixei na minha memória os lugares onde o livro acontecia, porque por eles também acontecera eu. de argumentos, personagens, acçons, nada recordava. nada. 
retomei o livro por ser proposta do novo clú de leitura no que enredei. e enredei em pereira e no seu conflito. e desta vez deu-me igual se a história acontecia em lisboa, ou em berlim ou em compostela. quantos pereiras nom terá havido nestes mundos de guerras e ditaduras, de injustiças?
como o livro é de sobras conhecido, só vou apontar que me pareceu essa diferência entre umha leitura e outra: da primeira só olhava lisboa, as sua ruas, o acerto na descreçom desse agosto que a mim tanto me custou suportar, como com essas limonadas e esse ventiladores consegue o tabucchi fazer-nos sentir a suor peganhenta. 
e agora só pensava no motor do livro, nessa questom proposta: devemos tomar partido? e desta vez também me serviu a mim para decidir implicar-me. nom sei se isso e bom ou mau, mas a responsabilidade é toda de pereira e a tenrura que transmite. 

leituras demoradas: desejo de ser punk.

belén gopegui: deseo de ser punk. anagrama. barcelona 2009.

é este o primeiro livro que leio com protagonista adolescente mas que nom é pensado para adolescentes. e claro, por isso mesmo, é a primeira protagonista adolescente em que acredito, que semelha pessoa autêntica e nom protótipo tópico com história típica. 

quase nom há cenas situada no licéu de secundária (viva!); quase nom há declaraçons de amor nem roubo de noivos e traiçons à super-melhor-amiga (viva! viva!).

só por isso o romance paga a pena. 

mas é que ainda por cima conta umha história de adolescente desorientada que devém em mulher desorientada, em filha desorientada, em ocidental desorientada, em burguesa desorientada, enfim, em pessoa que pom em questom o seu lugar no mundo dumha maneira crível. 

coloca questons sobre a mesa para fazer-nos pensar, como adoita e gosta de fazer belén gopequi, mas, quiçás por colocá-las desde a perspectiva dumha mocinha rebeldesemcausa, essas questom aparecem menos artificiais e forçadas que em outras obras e mais assumíveis como própias por mim, leitora. 

gostei muito.

outros livros que tenho lido de gopegui

terça-feira, 22 de março de 2011

atalanta

gianni rodari: atalanta. la galera. barcelona 1995.

gianni rodari é um velho conhecido, pois a sua gramática da fantasia e livro-bíblia e os seus contos por telefone umha das leitura que recordo já da escola.
e nessas procuras de um livro adequado para o meu alunado, querendo trabalhar mitologia com eles, soubem que versionara a história de atalanta, a mocinha despreçada polo pai por ser mulher. e provei a ler. 
primeiro houvo que conseguir o livro. nada fácil. seique era umha ediçom antiga (do ano 95 antiga, enfim!), mas acabou por chegar.
gianni rodari aplica á história de atalanta a técnica do incrementum: recria os diálogos que puiderom ter tido as donzelas, os soldados, os homens que a ela se defrontárom. aplica-lhe a digressio,levando-nos por outras histórias mitológicas com um simples ainda che há passar como a... e zás, solta a aventura de...
gostei da história de atalanta porque é um bom contrapunto á apologia da virilidade e a violência e o amor submisso que tem grande parte da literatura canônica. atalanta avança na vida observando o resto de seres humanos, homens e mulheres, e decidindo como (nom) quer ser.
até encontrar o seu espaço no mundo. 

um livro delicioso.

de amor e dor

anne sexton: poemas de amor. linteo poesia. madrid 2009.

tinha vontade de botar-lhe o dente a esta poeta, depois de saber dela há anos, através da carapuchinha encarnada (para que vejades de onde venhem as ligaçons leitoras). mas o livrinho que procurava nom o há em língua acessível para mim (tradutoras, traducide!). em troca dei com esta antologia de poemas de amor. 
custou ler. porque nom tinha o corpo para esta poesia de amor. dura. quase violenta. auto-ferinte. umha grande parte dos textos transmitem umha ideia das relações de parelha destrutiva com a que me resulta difícil sentir-me identificada. 
e deixava para outro dia.
e venha a começar de novo. 
e anotava um verso.
umha imagem.
e as transformava para as fazer minhas. 
e acabei por identificar-me com aquilo que escrevim eu lendo anne sexton

suponho que isso também é a leitura.

derradeiro encontro

sándor márai: el último encuentro. salamandra. barcelona 2010.

um livro de ritmo lento que atrapa como um filme de acçom. quando menos a mim. nunca pensei que umha narrativa tam vagarosa, tam amarrada às descrições me teria amarrada a mim à leitura. 
um velhote recebe o aviso de visita de um velho amigo. um amigo que nom vê há quarenta e um anos, exactamente. o velhote, um nobre general retirado, ordena preparar o recebimento do amigo pródigo e preparar a mesma ceia de há quarenta e um anos, exactamente. mas esta será a derradeira. há contas que ajustar. 

e assim, entretém-se aguardando polo convidado, rememorando o tempo em que se conheceram e intimaram; e chega o amigo e sentam a cear e recordam todos e cada um dos pormenores da sua amizade; e fam a sobremesa e seguem a ajustar contas com o passado, cena a cena, e nom podes parar de ler porque há um segredo que paira polas estâncias e que queres saber e nom dá chegado. 
passam as páginas e conheces todo sobre o valor da amizade, da confiança, da fidelidade mas o segredo, quem sabe!

leitura agradável.

sábado, 29 de janeiro de 2011

leituras demoradas: as vozes do deserto

marlo morgan: las voces del desierto. zeta bolsillo. barcelona 2009.

charo recomendou-me (e regalou-me) este livro para aquela constelaçom sobre ilhas. nom fala dumha ilha autêntica, mas dumha metafórica: o deserto australiano.

o livro é a crónica dumha viagem inesperada ao duro outback. marlo morgan acompanha umha tribo aborigem, provavelmente das que ficam incontaminadas polo progresso numha peregrinaçom através do deserto australiano. nessa viagem tem acesso aos conhecimentos, a concepçom do universo e da vida, á filosofia e a relaçom com a natureza dessa gente. umha gente impressionante, claro.

as vozes do deserto som as vozes dos aborigens, que elegem umha médica americana como portavoz perante o mundo ocidental, tecnológico. ela é a narradora desta história que nos faz chegar como testemunho dumha experiência transformadora por iniciática.

muitas das experiências narradas tenhem esse tom metafísico-patafísico dos gurus alternativos, mas ao mesmo tempo desejas que todo o narrado tenha acontecido na realidade porque desejas poder acreditar que esses aborigens som tam sábios e tenhem tam claras as cousas. em realidade, aquilo que narra esta mulher é umha utopia perdida num deserto, algo semelhante ao que narra, noutro sentido, o tuaregue de vázquez figueroa.

contra o vento

ángeles caso: contra el viento. editorial planeta. barcelona 2010.

nom estám na minha listagem anual de leituras os prémios planeta. mais bem é ao contrário. podem-me os prejuíços e tenho por costume nom atender-lhe.

mas caiu nas minhas mãos este contra el viento, porque fala também da áfrica, fala de mulher(es) em luita, fala de lisboa e fala de cabo verde. e dei em lê-lo. e contra os meus próprios prejuíços, gostei, ainda que a autora o tinha fácil depois da decepçom anterior.

o que mais agradecim foi a perspectiva da narradora. eu contava com umha história lineal, contada pola pseudo-autora-protagonista e centrada na personagem de são. mas resultou que para chegar a são 8que é a prota) antes tivem que conhecer a todas as mulheres que en volta de são andaram, saber das suas histórias anônimas, através dumha contadora de contos mui achegada aos narradores de tradiçom oral.

quero suponher que a autora faz aqui umha homenagem a essa capacidade contadora de quem lhe fez chegar a história. suponho. e isso conseguiu-no.

tam-pouco tem muito mais o livro. quero dizer que se lê bem, tem umha trama que atrapa, e dá para entreter algumhas tardes de chuva e frio, como estas que temos.

domingo, 9 de janeiro de 2011

tuaregue

alberto vázquez figueroa: tuareg. debolsillo. barcelona 2003.

outro romance com o deserto de fundo. mas este sim me entrou bem adentro e gozei-no imensamente.

um tuaregue que vive entre as areias do sara com a sua família recebe umha noite a dous viageiros perdidos. ao dia seguinte, o exército entra no acampamento mata a um dos homens e leva o outro pola força. ao tuaregue nom lhe queda outra que vingar esses atentados á lei do deserto, pois a sua honra vai na protecçom que nom soubo dar aos seus hóspedes.

começa assim, para nós leitoras, umha viagem polo deserto do sara, pola vida nómade dos tuaregues, as suas normas, as suas leis e a sua filosofia de vida. o livro lê-se como um velho western, onde sabes que o protagonista é o último dumha estirpe adaptada por séculos a viver num e dum dos climas mais estremos do planeta.

o romance envolve-nos com umha trama sedutora, na que sempre pensas que o protagonista vai ser vencido e na que este sempre te surprende com as soluçons que encontra. umha vida acorde com a natureza, condenada, por suposto, a desaparecer. como o tuaregue.

e o final, para mim, flipante. un autêntico romance de aventuras.

sábado, 8 de janeiro de 2011

o tempo entre costuras

maría dueñas: el tiempo entre costuras. temas de hoy. madrid 2009.

o livro tinha ingredientes que o faziam interessante aos meus olhos. protagonista feminina costureira. guerra civil e ditadura de fundo. outros espaços, neste caso, o norte de áfrica. o colonialismo e as suas ervas... mais nom.

nom gostei. lim-no a seguir, porque tem umha trama que engancha e fai que queiras avançar, mas nom metida nela, senom na distância. em realidade, apetece ler como quem vê umha batalha campal desde o alto, sem ter interesse em adentrar-se na história.

sira quiroga é umha rapariga madrilenha, subitamente rica graças a um pai recém-aparecido, á que um embaucador leva ao protetorado espanhol em marrocos com a escusa de investir a fortuna dela e fugir dos perigos da iminente guerra civil. mas o homem foge á argentina como todo o dinheiro deixando sira sozinha, prenhada e cumha dívida impagável no hotel. protegida polo comisário da cidade e ajudada por umha estraperlista, decide adicar-se á alta costura para juntar dinheiro e libertar-se da déveda. assim entra en contacto com as ricas alemás e británicas refugiadas em tetuám. e sabe dos seus segredos.

o que para mim falha no romance é a figura narrativa. a própria protagonista narra a sua história em primeira pessoa. num tom culto e elevado, carregado de rico vocabulário, de conhecimentos históricos e políticos que em nada quadram com a costureirinha protagonista. penso que nom está bem justificada essa consciência tam clara de todo por parte de narradora, por muito que saibamos que é sira com anos e experiências por cima.
também nom entrárom tantas justificaçons histórico-políticas polo meio da trama. nom é normal que rosalinda powell fox, para contar a sua história de amor com um senhor, tenha que degranar no mesmo discurso, todos os cargos políticos dele e todos os seus contactos e conhecidos no bando de franco. nom pinta nada.

por outra banda a narradora abusa da candidez aparente dos leitores. passa as páginas recordando o extraordinário das suas aventuras. eu penso que chega com que as conte. se som extraordinárias ou nom, já o decidimos nós. fartei da frasezinha "e quem me diria a mim, umha simple e ignorante costureira de um bairro de madrid, que ia... o que fosse".

ademais, e já para acabar, toma aos leitores por parvos: mais de três veces tem a necessidade de explicar-nos, por exemplo, a origem do seu segundo nome, arish agoriuq, bastante transparente em si mesmo.

enfim, que lim mas nom gostei.

por certo, o tocho de seiscentas páxinas que eu estava a ler em papel, andava a minha cunhada a lê-lo num finíssimo e ligeirinho e-book. agradeceram-lho os braços.