segunda-feira, 12 de novembro de 2012

entanto neva sobre os cedros


david guterson: mientras nieva sobre los cedros. traduçom de jordi fibla. barcelona, círculo de lectores 2000.

entanto neva sobre os cedros o tribunal tem que decidir a vida duma pessoa.
estamos em 1950. nas águas da ilha de são pedro, perto de seattle, aparece um marinheiro morto atrapado no aparelho do seu barco.
o xerife do condado desconfia da morte nom ser um acidente e, já nas primeiras pesquisas, é detido um vizinho como suspeito de assassinato. a intriga, por suposto, é sabermos se este ou nom é culpável.

o fio que guia o romance são os depoimentos de cada uma das testemunhas no juíço por assassinato contra kazuo miyamoto, o marinheiro imputado pola morte de carl heine. cada testemunha é uma história particular, que nos faz conhecer a sociedade da ilha, os seus costumes e tradiçons e o seu carácter isolado e fechado. 

um facto essencial é haver no lugar uma povoaçom estável de famílias de origem japonês. e estamos em 1950. numa ilha do pacífico. e as feridas da ii guerra mundial estám mui perto. 

é kazuo culpável ou é a vítima duma vingança racista? está a pagar as culpas do bombardeamento de pearl harbour? escuda-se no racismo para ocultar a sua participaçom no assassinato? 

uma das cousas das que mais gostei do romance é a clara relaçom entre o estado anímico dos protagonistas e o lugar que habitam. a natureza, a paisagem, o entorno estám presentes em todos os capítulos do livro, virando uma personagem mais da história. a pesca do salmom, os cedros, as praias e as ameijas, as plantaçons de morangos ou, como transparenta o título, a primeira grande tempestade de neve do inverno, reclamam o nossa atençom durante a leitura.

à parte de eu cair na conta de que para mim o exotismo é viajar ao norte, quanto mais perto do círculo polar ártico melhor, confirmei o temor de sempre: quanta boa literatura ficamos sem ler por desconhecimento da sua existência...

do romance figêrom versom cinematográfrica, que nom sei se é boa adaptaçom porque nom a visionei.




domingo, 28 de outubro de 2012

marcas de nacemento

nancy houston: marcas de nacemento. traduçom de david gippini. rinoceronte editora. cangas 2012.

o privado é político. isso deixa claro, por se alguém ignorava ou duvidava, este romance.

uma marca de nascimento, uma manchinha escura e pilosa na pele. eis a herança transmitida na família. e essa nódoa é vivida como um talismám ou como uma maldiçom -a de possui-la ou nom-. 

conhecemos a história da família através de quatro geraçons e quatro vozes que nos vam levando da mao até o pecado, desculpa, segredo original. nisto, o romance concorda com tantos outros de história familiar que oculta qualquer cousa no faio ou nas gavetas de velhas lacenas.

porém, duas cousas fam este romance diferente. 

as vozes que falam som as das protagonistas quando crianças. ao invês do habitual, onde encontramos velhotas sentadas na butaca com manta a proteger da reuma, e desvendado à neta o mistério daquele encontro no ano 1937, aqui chocamos com as vozes de dous meninhos e duas meninhas de 6 anos que narram os acontecimentos (essas marcas familiares) desde a sua olhada infantil.

e escrevo chocamos de maneira intencional. é um choque escuitar / ler as vozes dumas crianças em absoluto inocentes, em absoluto nhonhas, em absoluto cândidas. o primeiro capítulo pareceu-me brutal. e o terceiro impressionante. precisamente aqueles em que fala o fanatismo ad ovo

a narrativa funciona como uma memória ao invês. ou melhor. como a memória danada duma doente de alzhéimer que só acerta a reviver para nós farrapos esgaçados da sua neinice.

e erra, essa protagonista... só por conhecerde-la paga a pena a leitura.

marcas de nacemento fala-nos de como o público afecta ao privado. de como factos acontecidos há decadas a uma pessoa podem escarificar a pele doutras pessoas passadas várias geraçons. marcas de nacemento fai reflexionar sobre a memória, sobre o que contamos e como é recebido polas demais. marcas de nacemento fala-nos do fanatismo, que pode ter milheiros de faces e carautas, sendo sempre o mesmo, o Inimigo.
o romance está tam bem cosido, tam bem engarçado que a única vontade que me restou quando acabei de ler foi recomeçar a leitura e admirar as costuras, como as vizinhas que olham o revês duma toalha bordada para comprovarem a mestria da bordadora.

maravilha!


quarta-feira, 17 de outubro de 2012

leituras demoradas: a leitora

bernhard schlink: el lector. anagrama. barcelona 2000. 

lemos o livro no clube de lectura de adultos. e visionamos alguns trechos da versom cinematográfica. eu vira o filme quando a estreia, polo que a leitura foi feita com a trama sabida e os mistérios desvendados.

e igualmente adorei. e nom houvo essa reacçom decepcionante com uma e outro, outro e uma. lembrava ter gostado da película e gostei do romance. 

o leitor é um romance no que somos obrigadas a reflexionar sobre a culpa e o perdom. 

está estruturado em três partes, todas narradas polo protagonista, michael, nas que dá conta do seu encontro adolescente com hanna, uma mulher que o inicia sexualmente, o seu reencontro con ela, anos mais tarde, quando, estudante de direito, a reconhece entre as acusadas nun juíço por colaboraçom no holocausto, e finalmente, o seu úlitmo encontro, décadas mais tarde, quando ela sai de prisom ao cumprir condeia. 

em apariência, a trama está centrado no tema do holocausto, os judeus, o nazismo. e nisso centra a sua trama o filme (ou esse é o meu recordo): na culpabilidade que sente o protagonista por nom ter reconhecido uma nazista na mulher que amou (metáfora das novas geraçons que se auto-culpabilizam dos crimes nazis). mas agora, quando lim o livro, percebim que o autor em realidade nos convida a algo mais que ler uma outra visom do holocausto. propom-nos um dilema moral: pode um criminal ser redimido? há delictos imperdoáveis? que impede às vítimas perdoarem(-se)? pode ser reconstruída uma sociedade, apos um conflito violento, sem (re)conciliaçom?

a leitura do livro quadrou-me com um momento em que eram  novidade os encontros nos cárceres entre vítimas e presas da eta. eu nom pudem mais que relacionar uma cousa com a outra. e admirar a capacidade de uns e outros para falarem dos danos infringidos e recebidos.

porém o que a mim mais me deu que pensar foi o acontecido na juntança do clube de leitura. as leitoras sentimos empatias diferentes com respeito às personagens do romance: a mim e outras resultou-nos mais antipático o protagonista, no meu caso porque tem a oportunidade de salvar(-se) um pessoa e nom a aproveita, ao tempo que é incapaz de perdoar, nom consegue sentir piedade, o que faz que eu tam-pouco a sinta por ele. em troca, comoveu-me o personagem feminino pola dura aprendizagem que foi quem de fazer. outro grupo de participantes na sessom dirigiam essa antipatia cara a mulher protagonista, nom polos seus delictos nazistas, mas por um delito prévio: o de abuso de menores. consideravam que o dano feito a michael por parte de hanna era demasiado imenso; e que nom pagara o suficiente por ele. 

aquilo que a mim me deu que pensar foi o facto de que o segundo grupo de opinadoras estava integrado por nais e que no primeiro nom havia nenguma. era casualidade? é esse o facto que marca a diferência de opinions e empatias? tanto marca (nom) ser nai? o caso é que perguntei por essas simpatias -por quem sentes mais lástima, por michael ou por hanna?- a outras lectoras do livro e continuam a quadrar as contas. e eu continuo a dar-lhe voltas às marcas da maternidade.

penso que esse nom era, precisamente, o tema do livro. quem o diria!

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

um saco de bolas

joseph joffo: un saco de canicas. mondadori, barcelona 2010.

quando há tempo lim o neno do pijama raiado escrevim que nom acreditara na personagem protagonista, porque mais que menino ingênuo, parecia aparvado. daquela nom lera esta saqueta de pelouros. livrou-se o do pijama. a crítica havia ser ferozmente destrutora. 

porque este livrinho é uma maravilha. o protagonista também é um menino. é parisino e judeu e junto com o seu irmão maurice, dous anos mais velho, começa uma viagem pola frança ocupada do 1941 fugindo pola janela quando os nazis e a gestapo entravam pola porta.

já me caiu em graça porque começa o primeiro capítulo explicando a importância de ser campiom jogando ás bolas. e oferece nas primeiras linhas, a definiçom do que é um irmão: alguém a quem devolvemos a última bola que lhe ganhamos. joseph é um menino crível porque as suas reflexons correspondem-se com as reflexons de uma criança de dez anos, mas nom por isso deixam de ser reflexons sérias e interessantes. é ingénuo, mas nom parvo. e pode que nunca soubera realmente que andava em risco de morte, mas tinha claro que vivia em perigo.
por exemplo, jo leva uma decepçom enorme quando cruza a linha que separa a zona ocupada da zona liberada francesa: ele contava que ia ser semelhante aos defrontamentos cinematográficos entre índios e vaqueiros e resultou ser um passeio noturno. nom duvida em identificar uma colaboracionista porque uma pessoa tam odiosa como para compará-lo com o irmão (ai, és cuspidinho a maurice!) tem que ser traidora  por força.  e sempre confia em que voltará a juntar-se toda a família ainda que em cada escapadela deixe atrás pessoas que nunca mais vai ver...

do que mais gostei das andanças de jo e maurice é que sempre se salvam com uma combinaçom proporcionada de sorte e fabulaçom. ambos os dous som uns autênticos mentiráns. contam com uma capacidade extraordinária para aproveitarem qualquer pormenor da sua vida quotidiana e argalhar vidas e histórias que ocultem a sua identidade judeia. tam bem contam os contos e goçam de tal maneira as suas mentiras que porvezes semelham esquecer que elas som as suas armas de salvaçom.

jo vém sendo o joseph joffo menino e o livro nom som outra cousa que as suas memórias. joseph consegue manter na narrativa o ponto de vista duma criança de dez anos, que entende que deve fugir mas nom acaba de compreender por que, que se sabe judeia sem ter mui claro que é ser judeu, que sabe quem som os inimigos, mas é quem de fazer amizade com soldados italianos...  e todo isso é o que faz o livro delicioso.

cousa bonita.


segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Morgana em Esmelhe

begoña caamaño: morgana em esmelle. galaxia, vigo 2012.

para ler morgana há de ser lido antes o merlim do cunqueiro. nom por questons de subordinaçom patriarcal, eva e a costela de adám e essas cousas, mas porque este romance está escrito em contraponto com aquele de merlim.

o ponto de partida é simples: morgana aparece em esmelhe , nas terras de miranda, na outra fisterra, para arranjar contar com o velho meigo que aí se refugia e aclarar, de passo, quatro cousinhas à esmirriada de genebra. 

o romance narra o tempo da visita, e fai-nos viver a tensom que há nos quartos da casa grande e que manoelinha, filipe de amância e marcelina mal podem conciliar. só ao final a tensom é resolvida, nom vos conto se com arranjo ou com rebentaçom.

na história combinam-se as vozes de merlim, filipe e as mulheres de avalon, mas a perspectiva, o ponto de vista que se apom ao longo do discurso é o de avalon: a defesa do conhecemento científico ao serviço da comunidade fronte ao escurantismo e elitismo da nova religiom que invade europa. se a lenda do rei artur foi tingida de cristianismo, em morgana reivindica-se um laicismo nom sei se anacrónico, porém bem interessante. 

morgana só podia viajar a esmelhe porque só um merlim como o do cunqueiro, velhote, humilde, animoso e bom vizinho pode receber morgana na sua casa como filha pródiga. o merlim de excalibur teria-lhe metido um lostreghaço tipo son-goku que nos fastidiaria as reflexons que oferece este texto. 

achei de menos esse humor tenro que ressuma o livro de cunqueiro, e que creio lhe acaia mui bem a esta morgana recriada por begonha. ela coloca essa rejouba nos capítulos narrados por filipe de amância, nos que imita e é reconhecível o estilo do mindoniense.

leitura mui agradável.

 


sábado, 6 de outubro de 2012

leituras demoradas: pérez galdós reload

almudena grandes: inés y la alegría. tusquets, barcelona 2010
                            el lector de julio verne. tusquets, barcelona 2012.

ambos os romances fam parte duma série de título episódios duma guerra interminável.
sim, e continua a guerra civil a encher-me os tempos leitores. ambos os romances som as primeiras entregas dum programa de seis romances que a autora se marcou, seguindo o caminho marcado por galdós na sua série episodios nacionales.
neste programa, a grandes decidiu abordar outros tantos factos históricos acontecidos durante a guerra e a posguerra que ficárom ensombrados ou esquecidos polo abrumador protagonismo doutros feitos e polos corenta anos de propaganda ditatorial.

pois bem, comecei lendo inês, que ficciona o acontecemento real da invasom de la vall d'arán polo exército que os exilados republicanos organizárom em frança apos a queda do nazismo. a escritora inventa uma protagonista, inês, irmã fugida dum governador fascista e acolhida polos guerrilheiros e, en volta dela, faz aparecer, actuar e falar a uma moreia de personagens históricas que explicam, justificam ou criticam o fluir dos acontecementos: basicamente, por que os aliados nom aproveitárom a fim da ii guerra mundial para botar a franco do poder. pareceu-me imensa a construçom da personagem (sublinho: da personagem) da pasionária, tam crível, tam autêntica e tam clariescura.  

a leitura foi engaiolante como para aguardar com vontade a segunda entrega.

e lim o leitor de júlio verne, no que a grandes recria o mundo dos maquis e das guerrilhas que suportárom anos do luita nas serras e montes de toda a espanha franquista. ela centra a sua história nas serras de jaén, porém sem esquecer e estender fios a outras zonas guerrilheiras como as do norte e as galegas. o protagonista, neste caso, é o filho dum guarda civil, que vive, desde o espazo fechado do quartel, uma luita interior entre o amor ao seu pai e a amizade com um moinheiro "suspeito" de rebelde. 

a leitura foi engaiolante como para racionar a leitura e alongá-la no tempo, e, claro é, aguardar com vontade a terceira entrega.

a sensaçom que me deixárom no corpo estes dous romances é que almudena grandes chegou. deu com o estilo perfecto para contar boas histórias e deu com umas tramas acaídas a esse estilo. dos seus livros anteriores que lim, deixou-me um pouso amargo, um regosto acedo, o barroquismo adjectivador, a sensaçom de que sobravam metáforas e símis. agora nom. a sua voz nom invade o texto, nom se desparrama sem controlo polos parágrafos. tem o ponto justo de contençom que atrapa a quem a lê. sim, aprendeu, e muito, de galdós.

penso que, na actualidade, esta mulher nom está chamada a ser, é já, uma das grandes escritoras da lingua castelhana, e penso que se nom foi declarada tal, é por esse -a que acompanha á palavra escritor e por esse guerra civil que marca o tema dos seus últimos livros.

outros livros que lim de esta autora:
castillos de cartón



sábado, 29 de setembro de 2012

leituras demoradas: herdeiras pola força

xurxo ayán e manuel gago: herdeiros pola forza. patrimonio cultural, poder e sociedade na galiza do século xxi. 2.0 editora, santiago de compostela 2012.

sempre tenho presente a mesma estória: 

lá polo ano 99, a atl mistura, uma associaçom de tempo livre da que eu formava parte, foi contratada para gestionar um campo de trabalho na ilha de ons, dentro da campanha de verão da direcçom geral de juventude
lá fomos conhecer a ilha messes antes da actividade para argalhar uma programaçom bem geitosa. o campo de trabalho era de temática meio-ambiental e as tarefas a realizar polo voluntariado participante eram as indicadas polas responsáveis de meio-ambiente da ilha: limpar maleza, praias, sinalizar roteiros ou ajudar na recolhida de lixo e refugalho.

em ons demos com um  gerente muito implicado, luis era o seu nome, que nos fez uma proposta gorentosa: por que nom transformar a actividade em arqueológica e aproveitar para limpar e sinalizar o castro de ons? ele nom tinha problema em renunciar a parte da mão de obra gratuita que supunha o campo, faria-se cargo de pedir os permisos oportunos à DG de património, a terra onde assentava o castro era do estado, maquinária e ferramenta tinha o seu retém nos armazéns e o único gasto real era a asignaçom de pessoal técnico (uma arqueóloga) para dirigir a limpeza sem dano patrimonial. felizes viajamos no barco de volta pensando na actividade... 
mas nom... a direcçom geral de património negou-se categoricamente a amparar a actividade, proibindo-nos qualquer intervençom no entorno do castro. quem eramos nós para decidir que podia ser escavado e que nom?

foi assim tão grande a raiva que sentimos, que desobedecendo as ordens recebidas, durante a quinzena que nós levamos a actividade, limpamos de gestas e tojo tanto os acesso como a superfície do castro de ons. com duplo trabalho, pois nom arrancavamos nada para evitar o dano a possíveis restos.
foi emocionante descobrir os fojos ainda vivos e os perfís das muralhas exteriores e no alto, na croa, cada vez que retiravamos uma ramalhada, dar com fragmentos de cerámica.  e uma vez aberto o caminho e sinalizado, goçamos do orgulho de ver como as veraneantes subiam e perguntavam polas pegadas dos primígenos habitantes da ilha. e quando viajavamos no barco de bueu a ons ou de ons a bueu, admiravamos a silhueta do castro vísivel desde o mar por primeira vez em décadas. durante esse verão comprovamos como a cidadania respectava aquilo que lhe era accessível: nom houvo expólios nem destroços e sim interesse.

porém, nunca deixei de ter certo remorso por essa actividade, pois em múltiplas ocasions me tenho questionado sobre se tinhamos feito o correcto, se nom teriam razom os de património de que isso nom deveria ser tocado, ou sobre se era essa a actividade adequada para esse entorno.

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

outono aqui

mario regueira: outono aqui. sotelo blanco ediçons, santiago 2012.

tivo sorte mário com as expectativas criadas na minha volta com o seu romance. nom me deixei levar pola eufória inicial dalgumas pessoas, que falavam maravilhas do livro e aguardei. aguardei a que alguém me digera bah, nom é tam bom como dizem!. e tem sorte também com o facto de eu ter obedecido as ordens recebidas: nom leias a contra-capa, que desvenda parte do final (senhores de soteloblanco, nom ponham os carros diante dos bois).

enfim, como lim aguardando menos do romance e sem spoilers, o resultado é que gostei muito. muito muito. 
a história é singela, que nom simples: o protagonista é chamado ao pé do irmão ausente, rico e doente. e ele acode com a intençom de ajustar contas. que contas tem que ajustar é o que imos sabendo pouco a pouco entre passeios por gante, recordos da aldeia esquecida e de velhos contos de filhos pródigos.
gostei porque reflicte bem a destruçom do mundo rural e essa vida desubicada entre a cidade e a aldeia que já nom é. porque mostra bem às claras como umas geraçons sofrem em carnes próprias as feridas infringidas/recebidas polas anteriores. e porque utiliza mui bem o recurso das músicas (admitindo eu que a metade delas me eram desconhecidas)...
o que menos: o papel de helena... semelha-me um pouco forçado o seu rancor e a sua obsessom... em excesso veemente. 

e sobretodo gostei porque encontrei nele essa mistura de boa trama e estilo cuidado que achei a menos noutras leituras recentes.há literatura -o melhor, as imagens construídas partindo das cançons-, há ideias -propostas sérias de reflexom-, há política -nom panfletos-, há pessoas -nom estereótipos-, há criatividade ao serviço duma trama bem estruturada.

e há um rio de lavar que representa o melhor e o pior das pessoas.



sexta-feira, 21 de setembro de 2012

gaia e iria, iria e gaia

anxo angueira: iria. xerais, vigo 2012.
maria reimóndez: en vías de extinción. xerais, vigo 2012.


uma cousa tenhem em comum estes romances, fora a xerais como editora. 
conheço a anxo e maria. tenho em grande estima a ambas pessoas. isso faz que tenha pudor em escrever resenhas dos seus livros. é mais, decidim nom fazê-lo, porém também nom vejo porquê nom, e agora decidim que sim o vou fazer. e sei que amanhá decidirei arrepentir-me de ter-me decidido... 

sobretodo porque os dous som livros que eu lim (melhor, ruminei) em contraponto: faltou-me num aquilo que encontrei no outro. por isso os comento juntos.

iria nom é o nome duma moça, mas duma embarcaçom: o derradeiro galeom de cabotagem que navegou a vela polo mar da arouça. se conheço a angueira nom é por irmos juntos a congressos de poetas, senom por compartirmos navegaçom na ent dorna. na praia da canteira, onde passamos a tempada do verám, aguardavamos iria com grande expectaçom. 
e goçamos, goçamos reconhecer o léxico carcamám, as relingas e oitos e rises e escotas e estrovos a ressumar polas páginas do livro. encantou-nos ver recolhidas as estórias de afogados e afogadas, algumas delas escuitadas a bordo da peça de rabo ou da nova marina (maravilhoso o relato das águas do rio salgadas apos a morte de duas carrejadoras). goçamos com a homenagem á cultura marinheira que se desprende de cada linha. e lemos, e lemos e continuamos a ler... e acabou o livro e eu perguntei, já?. 

porque me faltou trama. é como se anxo gastara todas as forças em preparar-nos para um final comovente, e cansasse e desse por acabado o romance antes desse final que nunca chegou. sentim como se me fosse arrincado o livro das maos antes de o acabar.

e lim o de maria e passou-me o contrário: atrapou-me a história, enganchei na necessidade de saber qual era a grande ideia de gaia, figem por seguir os galhos e perder-me entre a ramalhada da árvore, seguim com gosto as aventuras de marinha. e lim, e lim, e continuei a ler... e acabou o livro e eu perguntei, assim? 

porque me faltou língua. achei de menos poder caminhar mais pausadamente, poder parar a remoer as estórias que o livro vai debulhando. foi como se a autora tivesse pressa por levar-nos ao desenlace e optara por obviar todas as revoltas com sombra para descansar e revisar o caminhado. achei de menos este goçar-se na narraçom por parte da narradora, sobre todo nas passagens acontecidas no monte: nas descriçons, na microtoponímia, no pormenor que faz emerger o invisível. sentim-me como empurrada a acabar a leitura já, já.

assim que tenho uma proposta para anxo e maría: juntai-vos e nascede, a meias, uma obra mestra da literatura galega.


segunda-feira, 17 de setembro de 2012

falando de livros

Lecturas no obligatorias.
nazaret também mercou o livro


wislawa szymborska: lecturas no obligatorias/más lecturas no obligatorias. ediçons alfabia. barcelona 2009/2012. traduçom de Manel Bellmunt Serrano.  

como nom encontrei poesia, merquei estes dous livros porque sim, por serem dela e com o risco de ficar decepcionada. 

e nom. 
a moscoscoia é deusa.
e para ela hei fazer uma estante privada na minha livraria.

estes dous livrinhos recolhem artigos em prosa que a poeta publicava numa revista de cracóvia em forma de coluna literária. eu digem para mim, que bem, vou ver de que literatura gostava esta mulher, que seguro descobro algum/a autor/a interessante. 
só que a maioria das obras resenhadas som das tradiçons eslavas e russa, das que, admito, conheço bem pouco. e como é que acabei um livro, e seguim com o outro e o acabei também? pois porque szymborska nom exerce de crítica literária, mas de leitora entusiasta. e resenha-o todo: desde o clássico greco-latino até o manual de auto-ajuda para ser feliz, passando pola guia de plantas de jardim. e em todos os casos sabe (des)animar-nos a ler com tanta retranca e tanto critério que comecei a pór-me verde de inveja porque já quigera eu escrever assim. 

o que mais invejei foi a sua aparente tranquilidade para desbotar aqueles livros que lhe parecem maus e a vontade de ler que nos dá aqueles dos que gosta. o papel é de mui boa qualidade, pode servir para empacotar presentes. e zás, acaba o artigo. 

e é certo também que aproveita boa parte dos livros para contar pequenas estórias que provavelmente som mais deliciosas que as obras resenhadas, mas como nom as lemos, nom podemos confirmar. há um artigo que começa relatando um potencial sonho do leitor: imagine vostede que sonha que desperta vivendo numa vila da idade meia... e narra todo o sonho: os encontros com a gente, os jantares, a vestimenta... para ao final afirmar se vostede sonhou isso é que nom leu o estupendo livro de fulanito que explica a vida quotidiana na idade meia, com as suas pulgas, os seus fedores e os seus caldos nojentos. tatachám!


enfim, uma deusa.



sábado, 15 de setembro de 2012

se nom queres caldo, sete cunqueiros

 merlín e familia e outras historias, editorial galaxia. vigo 1955.
as cronicas do sochantre, editorial galaxia. vigo 1956
os outros feirantes, editorial galaxia. vigo 1979.
si o vello sinbad volvese ás illas..., editorial galaxia. vigo 1961. 

sete nom forom, mais quase. a leitura foi apaixonada e devoradora. comecei com o merlim, levada pola leitura anterior de galván em saor, de dario xohán cabana. andava a buscar leituras artúricas para o meu alunado e acabei enleada nas cuncas mindonienses e reflexionando sobre os perigos das leituras obrigatórias.

lera cunqueiro em terceiro de bup ou cou, nom lembro. foi uma leitura obrigada e nom-explicada. tinhamos que ler na casa e fazer uma prova. nom percebim nada. e nom gostei. gostei assim tam pouco que cunqueiro ficou confinado ao andel dos clásicos incomprensíveis e pouco interessantes. como ademais o senhor simpatizava com as direitas e andava aos netos de vinho na festa do alvarinho, pois pior para ele perder esta leitora.  

ao ler agora merlim e família, gocei imensamente: da riqueza léxica, das múltiplas intertextualidades, do humor, especialmente do humor que ressuma em cada frasse, em cada pausa. porque podia contrastar a leitura com as leituras dos livros de cavalarias, com as lendas artúricas vividas no cinema e nos romances.

porém, o melhor foi recomeçar a leitura do si o velho sinbad... assim começa o relato: Botou as cascas de laranxa ao mar. Goteáballe o zugo polas mestas barbas. Berroulle ao rapaz que estaba facendo uns estrobos na gamela. e de súbito percebim por que nom gostara naquele afastado terceiro de bup. já na primeiro parágrafo palavras desconhecidas. se descubrim os estrovos na arouça, há nada de tempos!! se há quatro anos que diferencio uma gamela duma dorna! e seguim a ler e a rir porque cruzava este sinbad com o das mil e uma noites que, sim, agora tenho lidas e relidas. 

quanto dano fazemos ás vezes nas nossas aulas! como podemos dar a ler uma obra sem contextualizá-la, sem acompanhar a leitura, sem subministrar as chaves de interpretaçom... certo é que a minha experiencia destrutora do grande cunqueiro vém de há vinte anos, mas as práticas em muitas aulas de literatura nom tenhem mudado muito com a mudança de século. 
penso que, a dia de hoje, é preferível ler um só capítulo, um só poema, um só trecho de qualquer obra, acompanhando ao alunado na leitura, que abandoná-lo num território sem mapas nem guias.

a mim dérom-me caldo e nom gostei. mas soubem recuperar os sabores e eu, que nom quigem cunqueiros, tomei sete cuncas. quantas companheiras de classe nom tiverom a mesma sorte?

renascença

Education

meu pobre comopamdaboca, que leva messes no mais absoluto abandono! o tempo levou-me por outras enormes margens, que nom coutárom a leitura, mas sim o registo escrito da mesma. 

tenciono seguir...

...e continuo.

A imagem leva por título education. É de thiane e tirei-na de aqui.